🔎 Afinal, quem é o culpado pelo apagão em SP?
#157: Nunes e Boulos disputam narrativa sobre responsabilidade da falta de luz na capital
Boa sexta-feira, 18 de outubro. Eu sou Marcela Duarte, gerente de Produto da Lupa, e hoje minha colega Nathália Afonso, analista de Projetos Editoriais, destrincha a disputa de diferentes narrativas em torno da responsabilidade pelo apagão em São Paulo. Não deixe de ler as notas da seção “Lupa Indica”, com o melhor do que nossa equipe tem visto por aí. Boa leitura!
Em disputa de narrativas, candidatos entram em confronto sobre falta de luz em SP
O apagão em São Paulo virou uma grande batata quente nas eleições à prefeitura da cidade. Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) vêm usando suas redes sociais e participações em debates e entrevistas para apontar um ao outro (ou aliados de cada um) como o responsável pela falta de luz que afetou grande parte da capital paulista. Boulos culpa Nunes, que culpa o governo federal, que já demonstrou apoio ao psolista.
No final, quem fica confuso são os eleitores, bombardeados com o assunto nas redes sociais.
A falta de luz começou na sexta-feira (11), quando um forte temporal atingiu a capital e outras cidades do estado. No mesmo dia, Boulos passou a utilizar as redes sociais para afirmar que Nunes seria um dos responsáveis pelo apagão. Nos dias seguintes, Boulos incluiu mais um nome entre os culpados pela falta de luz: a Enel, companhia italiana que assumiu as operações da Eletropaulo em 2018.
O candidato do PSOL aproveitou a sua participação em sabatinas e debates para falar sobre o caso. Na quinta-feira (17), em entrevista para Folha de S.Paulo, UOL e RedeTV!, Boulos disse que a Enel é a “mãe”, e Nunes é o “pai do apagão”.
No debate da Band de segunda-feira (14), ele também falou sobre o tema: “esse apagão tem dois grandes responsáveis. A Enel, que é uma empresa que presta um serviço horroroso e que eu, como prefeito de São Paulo, a partir de 1º de janeiro do ano que vem, vou trabalhar para tirar ela daqui, e o Ricardo Nunes, porque não fez o básico, o elementar, a lição de casa. Poda de árvore na cidade de São Paulo, manejo arbóreo, e olha que a gente teve um apagão há menos de um ano. Tava ali. Tava avisado. Nada foi feito de lá para cá. Na verdade, a cidade hoje tá refém dessas duas incompetências: da Enel e do prefeito”.
Ricardo Nunes, por sua vez, tenta indicar que a responsabilidade pelo apagão seria da Enel e do governo federal, liderado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que apoia Boulos. Uma forma indireta de atacar seu adversário.
Também no debate da Band, o prefeito disse que as mudanças climáticas impactam o mundo, mas que a prefeitura já havia criado uma secretaria especial para tratar deste assunto. E emendou criticando a Enel. “É inaceitável o que essa empresa Enel tem feito com a cidade de São Paulo. É inaceitável que o governo federal, que é quem detém a concessão, a regulação e a fiscalização, não tenha feito nada. Isso desde novembro do ano passado”, afirmou.
Nunes aumentou o tom das críticas dizendo, em entrevista, que ainda no ano passado havia solicitado ao Ministério de Minas e Energia, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e ao Tribunal de Contas da União (TCU) a rescisão do contrato da Enel. Ele voltou a fazer o pedido nesta semana, após a falta de luz.
Quem, afinal, é responsável pelo apagão? A resposta é complexa e envolve diversos atores com diferentes papéis.
Começamos pela Enel. Tanto Nunes quanto Boulos concordam que a empresa é uma das grandes responsáveis pelo apagão. A concessionária fornece energia em São Paulo por meio de uma concessão que se encerra em 2028. Ela é a responsável por religar a luz de moradores que foram afetados pelo temporal, serviço que demorou a ser feito. Segundo a companhia, 100% dos clientes afetados pela chuva e que estavam com registro ativo no sistema voltaram a ter energia elétrica na noite desta quinta-feira (17).
A empresa tem concessões em outros dois estados brasileiros: Rio de Janeiro e Ceará. Até 2022, também era a concessionária em Goiás, mas vendeu a operação após uma série de problemas – entre eles, a grande frequência de apagões.
O ponto de discordância entre Boulos e Nunes é sobre a fiscalização da Enel. Nunes indica que seria uma responsabilidade do governo federal, enquanto Boulos afirma que é um dever da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp).
De fato, é responsabilidade da Aneel fiscalizar o serviço prestado pela Enel. A agência é uma autarquia ligada ao Ministério de Minas e Energia, o que significa que o serviço da agência é autônomo. Os diretores da Aneel são indicados pelo presidente da República, tendo um mandato de vigência. Os atuais presidente e diretores da Aneel foram indicados por Jair Bolsonaro quando era chefe do Executivo.
Após a chuva, a Aneel indicou em nota que estava acompanhando o trabalho da Enel. “Caso sejam constatadas falhas graves ou negligência na prestação do serviço, a Agência não hesitará em adotar as medidas sancionatórias previstas em lei, que podem incluir desde multas severas, intervenção administrativa na empresa e abertura de processo de caducidade da concessão da empresa.”
Na última quarta, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, cobrou que a agência abrisse um processo "rápido, célere e objetivo" para apurar se a Enel vem descumprindo cláusulas do contrato. O ministro aproveitou para criticar o prefeito, indicando que Nunes estava propagando “fake news” sobre o caso.
A Arsesp também precisa fiscalizar todas as concessionárias do estado de São Paulo, entre elas a Enel. Na lista das competências que consta em seu site, a fiscalização de serviços de energia aparece em destaque, ainda que indique que a responsabilidade maior seria da União. A agência é uma autarquia do Governo do Estado de São Paulo.
Por último, mas não menos importante, a poda de árvores é outro fator de suma importância nesse contexto. O serviço é responsabilidade da prefeitura de São Paulo e da Enel, que cumpriu menos de 1% das podas a que se comprometeu em 2024. Em 2023, foram 248 mil pedidos de podas de árvores, sendo que pouco mais de 7 mil foram realizados, ou seja, 2,8% dos pedidos. A poda de árvores é essencial para evitar que haja danos na fiação.
A previsão para este fim de semana é de chuva forte na cidade de São Paulo. No final de semana seguinte, veremos como — e se — os reflexos da chuva desaguarão nas urnas.
A Lupa lançou o Será que é Golpe?, site que reúne conteúdos checados sobre golpes e fraudes digitais. O projeto é uma parceria com o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) e traz mais de 120 conteúdos verificados sobre diferentes tipos de golpes e fraudes digitais, além de orientações sobre como proceder caso o golpe já tenha ocorrido. Com as informações sobre os mais variados tipos de golpes em um só lugar, a Lupa facilita a busca por orientações, ajudando a reduzir o número de vítimas desse tipo de crime. A iniciativa partiu do aumento nas ocorrências de golpes financeiros no país e tem apoio e financiamento da Consumers International Fair Digital Finance Accelerator (CI). [Flávia Campuzano, analista de Produto]
Para quem gosta de ler sobre desinformação, aqui temos duas sugestões que estão bombando nos Estados Unidos (e que ainda só têm versões em inglês). Em “Invisible Rulers: The People Who Turn Lies Into Reality”, Renee DiResta mergulha nas mentiras que buscam colocar em xeque a credibilidade das eleições americanas (e, em consequência, no resto do mundo ocidental). Em "Beyond the Big Lie: The Epidemic of Political Lying, Why Republicans Do It More, and How It Could Burn Down Our Democracy", Bill Adair expõe como políticos manipulam a verdade e impactam a sociedade, além de mostrar como os republicanos tentam moldar o ambiente político dos Estados Unidos para que suas mentiras sejam aceitas. [Cristina Tardáguila, fundadora da Lupa e repórter]
A Universidade Federal da Paraíba (UFPB) deu um passo importante na luta contra a desinformação no estado com a criação do Alumia, laboratório inovador que vai monitorar e combater conteúdos enganosos que circulam nas redes sociais. O projeto é formado por pesquisadores, comunicadores, professores e estudantes, e vai atuar em quatro áreas: checagem de notícias falsas, educação midiática, inovação tecnológica e pesquisa sobre desinformação. A iniciativa inédita é financiada pela Agência de Inovação Tecnológica de João Pessoa (Inovatec-JP). [Ítalo Rômany, repórter]
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