🔎 Lente #53: "Liberdade" de mentir vale US$ 44 bi para Musk
Boa sexta-feira, 29 de abril. Veja os destaques da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa:
Elon Musk topa pagar US$ 44 bilhões pela "liberdade" de mentir, atacar e perseguir;
Unesco usa Lupa como exemplo de iniciativa inovadora em livro sobre o cenário jornalístico;
Robôs e o aumento nos seguidores de contas ligadas à extrema-direita.
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Quanto custa a "liberdade" de mentir, atacar e perseguir? Elon Musk acha que são US$ 44 bilhões
Na segunda-feira (25), o bilionário Elon Musk, atualmente o homem mais rico do mundo, concluiu acordo com a diretoria do Twitter para comprar a empresa por US$ 44 bilhões. A compra ainda não foi concluída e depende de aprovação de acionistas e órgãos reguladores. As perspectivas, contudo, não são nada positivas.
O Twitter está longe de ser uma plataforma exemplar no combate à desinformação. As políticas, ainda que claras, são pouco abrangentes e aplicadas de modo inconsistente. Mas é necessário reconhecer que a plataforma tem avançado nos últimos anos, com a inclusão de sinalizações em publicações falsas — que levam a conteúdos informativos — e a possibilidade de denunciar conteúdos desinformativos. É possível que, com Musk, os poucos avanços fiquem pelo caminho ou venham, até mesmo, a regredir.
O bilionário se autodenominou, recentemente, um “absolutista da liberdade de expressão”. Na mais benigna das interpretações, essa expressão aparentemente nobre é uma visão infantil do conceito de liberdade — como um direito de fazer o que bem entende sem ter que arcar com as consequências. A Constituição garante a todos o direito de ir e vir, mas nem por isso você pode entrar deliberadamente em alas destinadas a pacientes de doenças altamente infecciosas de um hospital, por exemplo. A liberdade de culto não permite agredir alguém ou vandalizar um espaço por motivos religiosos. Por que, então, a liberdade de expressão deve servir como manto protetor para quem usa as redes sociais com o intuito de desinformar, com finalidades obscuras como sabotar uma campanha de prevenção a uma doença ou mobilizar a derrubada de governos democraticamente eleitos?
Em sua cruzada “absolutista”, o bilionário costuma equivaler a moderação de conteúdos desinformativos e de discurso de ódio e a punição de mentirosos reincidentes à censura. Mas a comparação é completamente inadequada. No caso da desinformação, trata-se de rotular, reduzir o alcance ou apagar (dependendo da plataforma e da gravidade do conteúdo) conteúdos com alegações comprovadamente falsas que podem causar danos reais à população. Não se trata de proibir a circulação de ideias, opiniões e previsões, mas sim de evitar que informações falsas prejudiquem indivíduos.
Acontecimentos recentes, principalmente a pandemia de Covid-19, mostraram a importância da restrição de circulação de conteúdos falsos. Mentirosos profissionais passaram dois anos usando as redes sociais para minar os esforços da sociedade no combate ao coronavírus e, assim, foram indiretamente responsáveis pela morte de milhares de pessoas. Políticas mais rígidas de combate à desinformação por parte das redes sociais poderiam ter evitado parte dessa calamidade. Isso para não falar do efeito da desinformação nas eleições estadunidenses em 2020 — e da torrente de teorias da conspiração envolvendo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aqui no Brasil.
Desde que o acordo foi fechado, Musk tem usado sua conta no próprio Twitter para atacar lideranças da empresa envolvidas no aprimoramento das políticas de moderação da plataforma. Trata-se de mais um sinal preocupante sobre os rumos que a rede deve tomar se estiver sob o comando dele. Isso é condizente com sua pessoa pública. Vale lembrar que ele acusou, falsamente, um mergulhador tailandês de ser pedófilo. Na ocasião, tudo o que seu alvo fez foi se recusar a usar um mini-submarino desenvolvido pela equipe de Musk em um resgate — que, aliás, foi bem sucedido.
O comprometimento de Musk com a liberdade de expressão, no entanto, vai até a página 2. Quando um de seus empregados vazou informações sobre irregularidades em sua empresa, após tentar que o problema fosse resolvido internamente, a companhia fez questão de persegui-lo brutalmente. Outro funcionário alega ter sido demitido por apontar problemas de seguranças em suas fábricas.
A liberdade de expressão absoluta talvez até exista. Mas só está disponível para quem tem US$ 44 bilhões para comprar o Twitter.
Abraços,
Chico Marés
Coordenador de Jornalismo
Unesco usa Lupa como exemplo de iniciativa inovadora em livro sobre o cenário jornalístico
A Lupa foi escolhida pela Unesco como um dos exemplos de iniciativas inovadoras no jornalismo atual. O livro After the pandemic, building back a stronger media: inspiring initiatives in ensuring media viability (Construindo uma mídia mais forte após a pandemia: iniciativas inspiradoras para garantir a viabilidade da mídia, em português) lista 11 casos de sucesso em modelos de negócios nas mais variadas áreas do jornalismo. O guia deve servir para ajudar outros veículos a superar as dificuldades econômicas causadas pela pandemia e está disponível gratuitamente no site da organização em inglês, espanhol e francês.
“Em meio à escuridão da crescente pressão financeira, há muito a aprender com a criatividade e as ações tomadas pela mídia em seu esforço de sobrevivência: jornalistas, editores, educadores e outros profissionais da mídia desenvolveram e estão desenvolvendo estratégias inovadoras para ajudar a fortalecer a viabilidade de mídia independente”, enfatiza a Unesco.
O caso da Lupa foi usado como exemplo de evolução do jornalismo de checagem de fatos nos últimos anos. O texto conta como a empresa começou pequena e focada somente na checagem de fatos, mas cresceu para incluir a educação e a verificação de conteúdos em seu escopo — tornando-se um hub de combate à desinformação.
“A verificação de fatos é apenas uma das ferramentas na batalha contra a desinformação. Tem que ser por meio de projetos que tenham impacto tecnológico, tem que ser por meio da educação, tem que ir nas escolas e ensinar as pessoas. Apenas o jornalismo não será suficiente”, contou a fundadora da empresa, Cristina Tardáguila, no livro.
…nos robôs: nesta semana, os perfis do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de diversas contas ligadas à extrema-direita brasileira tiveram um aumento bastante significativo no número de seguidores. Em um único dia, 65 mil novos perfis passaram a segui-lo — geralmente, esse número gira em torno dos 6 mil. Tudo indica que se trata de robôs. Uma análise feita pelo BotSentinel, uma ferramenta que avalia a possibilidade de um determinado perfil ser automatizado, mostrou que 58% destes novos seguidores foram criados em apenas dois dias, com alta probabilidade de serem automatizados. O mesmo foi verificado com contas de personalidades de direita nos Estados Unidos.
…no YouTube: a Câmara Municipal de Goiânia foi suspensa do YouTube por reproduzir conteúdos falsos na plataforma. Foram identificadas denúncias em relação a dois vídeos: um deles, tratava de uma sessão plenária comum. O outro, de uma audiência pública sobre a pandemia. No ano passado, picaretas profissionais realizaram seguidas audiências em câmaras e assembleias, a convite de parlamentares negacionistas, para espalhar mentiras sobre a Covid-19. A matéria é do G1 de Goiás.
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