Lente #63: Bolsonaro desinforma ao minimizar violência
Boa sexta-feira, 15 de julho. Veja os destaques da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa:
Presidente cria falsa conexão ao tentar se desvincular do assassinato do guarda municipal;;
Regulamentação da mídia vira tema de campanha, mas pode ser usada para desinformar;
Novela entre Twitter e Elon Musk ganha novo capítulo.
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Bolsonaro, o tripé e a desinformação que minimiza violência
O assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda, petista, pelo bolsonarista Jorge José da Rocha Guaranho fez com que o presidente da República, Jair Bolsonaro (Partido Liberal), fizesse uma série de malabarismos para fugir das críticas de incitar a violência. Bolsonaro ainda promoveu desinformação ao descontextualizar uma série de atos feitos por ele no passado, que foram resgatados para demonstrar como Bolsonaro estimulava o ódio contra seguidores do ex-presidente Lula e do PT.
A prática ganhou destaque quando a cantora Zélia Duncan publicou um tweet criticando a postura de Bolsonaro, em 2018, no Acre. Na ocasião, ele apareceu segurando um tripé e, com o objeto, simulou que estava atirando. Durante o gesto ― que pode ser visto em vídeos que circularam na internet ―, o presidente afirma claramente “vamos fuzilar a petralhada”. A cantora, em seu texto, errou ao dizer que o presidente segurava um fuzil.
A partir do erro na publicação, Bolsonaro debochou: “Zélia, era um tripé”. Em seguida, afirmou que sua declaração foi “em sentido figurado”, relembrou a facada que recebeu na campanha e disse que a faca não era de brinquedo, era real.
Não há espaço para sentido figurado no verbo "fuzilar", nem mesmo para o gestual simulando atirar. A tentativa de minimizar sua incitação à violência contra a “petralhada” após a morte de um petista é uma forma de desinformar sobre o episódio. A pesquisadora Claire Wardle, ao tipificar os tipos de desinformação que existem, traz dois conceitos que fazem a gente entender o que Bolsonaro tentou promover. Segundo a nomenclatura da pesquisadora do First Draft, o presidente tentou criar uma falsa conexão ao descontextualizar que incitava a violência e focar que segurava um instrumento de plástico.
A “falsa conexão” geralmente é utilizada de maneira mais direta, por exemplo, quando se usa uma foto ou um vídeo real e se coloca uma legenda que não tem relação com o que está sendo visto. Bolsonaro foi mais sutil ao ignorar completamente a maior parte do vídeo em que aparece simulando atirar: criou uma falsa conexão entre um elemento do que é visto, o tripé, com todo o contexto. Essa utilização leva à produção do que Wardle chama de “conteúdo enganoso”, quando se usa uma informação de forma equivocada para tentar enquadrar uma narrativa ao seu gosto.
O episódio mostra como o ecossistema da desinformação é amplo e suas peças podem ser utilizadas de diferentes maneiras. Não se pode mais ter a ingenuidade de achar que as mentiras surgiram de forma escrachada. É provável que o maior desafio das próximas eleições seja exatamente a descontextualização frequente do que se vê, do que se lê e do que se analisa. Faltando um mês para o início da campanha, o fato de o presidente não ter revisto sua declaração mostra que precisamos ser mais exigentes no combate à desinformação.
Abraços,
Raphael Kapa
Coordenador de Educação
Regulamentação da mídia volta a ser tema de campanha
O debate sobre a regulamentação da mídia volta como tema de campanha de Bolsonaro, mas há o perigo de se associar uma ausência de legislação, pregando-se a liberdade de expressão, com a prerrogativa de que tudo pode ser dito sem responsabilização. Outro perigo é que o discurso utilizado pelo presidente tenta associar ― utilizando as técnicas já feitas pelo americano Donald Trump ― o termo fake news com a imprensa tradicional.
Nesta semana, Bolsonaro publicou um vídeo em suas redes sociais de uma declaração feita por ele em 2018 dizendo que não fará nenhuma lei “para controlar a mídia”, já que a população sabia lidar bem com o que ele chama de fake news ― matérias da Folha de S. Paulo e pesquisas do DataFolha. A recuperação desse vídeo ocorre em um momento em que os números de votos em Bolsonaro nos levantamentos não decolam e em que se desenha uma polarização entre ele e Lula nas eleições. O debate sobre a regulamentação da mídia coloca ambos em espectros bem diferentes nesse ponto.
O problema é que a discussão promovida até então é superficial e pode ser entendida como espaço para propagação de discursos de ódio. A publicação do vídeo de Bolsonaro acontece na semana em que o repórter Chico Alves, do UOL, publicou que ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) em canais de extrema direita no YouTube cresceram 300% no último ano.
…no Twitter: que acusou o empresário Elon Musk, em um processo de 62 páginas, de violar o acordo de compra da rede por R$ 44 bilhões. Musk tentou desistir da aquisição citando números relativos a contas falsas e dizendo que a empresa não lhe deu informações suficientes. A empresa afirma que a estratégia adotado pelo homem mais rico do mundo é um “modelo de hipocrisia” e de “má fé” e indica que ele deve finalizar a compra. A novela entre Musk e Twitter deve ganhar mais capítulos nas próximas edições da Lente.
…no TikTok: que firmou parceria com a Lupa para promover educação midiática e combater a desinformação com foco nas eleições. O primeiro vídeo foi ao ar nesta semana. Colaboradores da Lupa que atuam no combate à desinformação passarão para a frente das câmeras para tratar dos mais variados temas relacionados à desinformação nesse período. O coordenador de educação da Lupa, Raphael Kapa, o repórter Bruno Nomura, a analista de Audiência e Engajamento, Mikhaela Araújo, e a estagiária de Audiência e Engajamento, Nycolle de Moraes, serão os apresentadores do projeto.
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Obrigado pela leitura e até a próxima semana
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