🔎Lente #66: TSE restringe divulgação de dados de candidatos
Boa sexta-feira, 5 de agosto. Veja os destaques da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa:
Dados sobre os bens dos candidatos desaparecem no site do TSE;
Desinformação sobre oposição de Lula e Febraban ao Pix começou com montagem;
Militares começam agora a inspecionar o código-fonte das urnas, disponível desde outubro do ano passado.
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TSE restringe divulgação de dados sobre patrimônio de candidatos
Nestas eleições, vai ficar mais difícil checar o patrimônio dos candidatos. O TSE decidiu que, com base na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), não dará mais detalhes sobre o patrimônio de quem vai disputar as eleições. Os concorrentes continuarão tendo que declarar seus bens, mas, na página disponível ao público — o sistema DivulgaCandContas, já usado em outras eleições —, só será possível ver uma descrição genérica de cada item. No passado, por exemplo, era possível saber o modelo de um determinado veículo declarado por um candidato, ou a localização de um imóvel. Agora, será fornecida apenas uma descrição genérica — “carro”, “apartamento”, “aplicação” etc.
Essa mudança deve dificultar apurações sobre, por exemplo, a evolução patrimonial dos candidatos — ainda que os números brutos não impeçam esse tipo de comparação totalmente. Mas isso dificulta que o eleitor saiba, por exemplo, se um determinado candidato tem participação societária em empresas que possam ser alvo de um conflito de interesses caso ele seja eleito. É evidente que, nem sempre, as declarações fossem informações precisas para avaliar o patrimônio real de um indivíduo — muitas de suas propriedades podem estar, legal ou ilegalmente, no nome de terceiros, como familiares ou, em casos mais escusos, “laranjas”. Mas era, sem sombra de dúvida, uma ferramenta útil.
Mais grave que isso, a mudança é um sintoma do uso da LGPD como um pretexto para atacar ferramentas de transparência no Brasil. Não é a primeira vez que discutimos na Lente a tensão que existe entre a proteção dos dados individuais de cada brasileiro e a necessidade de transparência de políticas públicas e, nesse caso, sobre as candidaturas de uma eleição majoritária.
Sob a alegação de LGPD, microdados do Censo Escolar foram omitidos e isso impossibilitou que pesquisadores, jornalistas e checadores pudessem avaliar de forma efetiva se programas da área foram desenvolvidos, seus impactos e até mesmo cobrança sobre os governantes.
Essa listagem de bens não é exatamente o patrimônio que o candidato tem, mas o que ele declara ter. É possível que candidatos possam apresentar declarações diferentes para a Justiça Eleitoral e para a Receita Federal. Dessa forma, o que está sendo escondido são informações que o próprio candidato declara.
Organizações, como a Transparência Brasil, lançaram na última terça-feira, um manifesto afirmando que o episódio é “grave retrocesso”, que “já seria crítico em um contexto de normalidade”, mas que “é inadmissível na conjuntura atual, quando pode servir de argumento a questionamentos da lisura das eleições no país”.
Por esse motivo, seria importante que o TSE fizesse uma reavaliação dessa medida pensando na necessidade da manutenção da transparência desses dados. Perante a tantas iniciativas que o tribunal está fazendo de maneira correta pela defesa da urna eletrônica, da Justiça Eleitoral e da lisura do pleito de outubro, um retrocesso como esse pode ser um perigo diante desses esforços.
Abraços,
Raphael Kapa
Coordenador de Educação
Como uma montagem tosca vira uma narrativa desinformativa
No começo, era apenas mais uma informação falsa dentre muitas que circulam no WhatsApp. Uma imagem mostrava a seguinte manchete no site G1: “Lula diz que um de seus projetos é acabar com o Pix assim que assumir a presidência”. O ex-presidente nunca disse isso — na verdade, ele é favorável ao mecanismo de pagamento e já declarou isso publicamente. E, claro, isso a Globo não mostrou, justamente porque não era verdade: tratava-se de uma montagem muito simples. Nós desmentimos essa peça desinformativa em conteúdo feito pelos participantes do nosso programa de trainee Mirante no dia 7 de março.
Eis que, meses depois, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) anunciou apoio a um manifesto em defesa da democracia. E a história voltou com força: agora, a Febraban teria “declarado apoio a Lula” — não declarou, assinou um manifesto defendendo o Estado Democrático de Direito — porque teria perdido R$ 40 bilhões com o Pix — não perdeu, a queda na receita dos cinco maiores com tarifas foi de cerca de R$ 2,5 bilhões, mais do que compensada por um dos anos mais lucrativos na história do setor em 2021 — e o ex-presidente teria se comprometido a acabar com esse modelo de transparência bancária — não se comprometeu, pelo contrário, disse ser totalmente favorável ao sistema. Desmentimos de novo.
O que era só uma montagem tosca que circulava nas redes sociais em março virou uma narrativa completa em agosto. E foi além do submundo das redes: em entrevista à rádio Guaíba, o próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) fez uma referência pouco sutil a essa grande conspiração para acabar com o Pix — a exemplo do que o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), que havia feito essa mesma referência mentirosa dias antes. "Olha quem assinou [a carta pela democracia]. Os banqueiros. Os banqueiros estão contra o Pix. O Pix, que nós tiramos mais de R$ 20 bilhões de banqueiros pelo Brasil", disse o presidente.
Esse é só mais um exemplo de como pequenos fragmentos de desinformação, uma montagenzinha ali, um videozinho editado maliciosamente acolá, aos poucos vão se juntando para criar uma narrativa completa que explica — falsamente — os eventos do mundo real. E é por isso que buscamos checar esses conteúdos. O debate público não pode ficar refém desse tipo de manipulação.
Um abraço,
Chico Marés
Coordenador de Jornalismo
…nas Forças Armadas: militares pediram nesta semana para checarem o código-fonte utilizado nas urnas eletrônicas. A inspeção começou na quarta-feira após um pedido tratado como “urgentíssimo” pelos representantes da Defesa nacional. O TSE liberou a investigação do material até 20 dias antes das eleições, quando as urnas serão lacradas. O detalhe desse episódio é que os militares poderiam ter ido desde outubro do ano passado fazer essa vistoria sem necessidade de envio de ofício.
…no Metaverso: com a mudança do nome do Facebook para Meta, o metaverso passou a ser visto como um espaço potencial para novos tipos de empregos e trabalhos surgirem. Estrategista de NFT, engenheiro de blockchain e desenvolvedor de ecossistema eram algumas das funções que futuristas começavam a dizer que eram necessárias para o futuro. Mas, parece que não será bem assim. Pesquisa mostra que esse tipo de trabalho não está se desenvolvendo como esperado e que — devido a crises nas plataformas — a solução não será buscar emprego em uma realidade alternativa ou ampliada.
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Obrigado pela leitura e até a próxima semana
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