🔎 Lente #76: Checagem sim. Doa a quem doer
Boa sexta-feira, 6 de janeiro. Veja os destaques da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa:
Lupa se compromete a honrar sua missão: checar quem quer que esteja no poder;
A incrível história do congressista eleito por Nova York filho de brasileiros que mentiu compulsivamente em seu currículo;
A Procuradoria Nacional da Defesa da Democracia e a polêmica que ela provoca.
Curte a Lente? Envie este link e convide seus amigos para assinarem a newsletter
Doa a quem doer
Quem acompanha a Lupa pode ter estranhado que, nesta semana, publicamos apenas três checagens focadas nos políticos empossados nos últimos dias. Outras pessoas demonstraram surpresa ao ver checagens sobre o novo governo.
Nesta primeira semana do terceiro mandato de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nos debruçamos sobre os discursos de posse dele, de seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e de sete ministros. Checamos as falas de Fernando Haddad (Fazenda), Camilo Santana (Educação), Silvio Almeida (Direitos Humanos), Nísia Trindade (Saúde), Simone Tebet (Planejamento), Marina Silva (Meio Ambiente) e Carlos Fávaro (Agricultura).
Das nove avaliações, entretanto, somente as de Lula, Haddad e Santana foram publicadas, ou seja, chegaram ao grande público. Isso porque esses três discursos continham informações enganosas que precisavam ser esclarecidas à sociedade. Nos demais, vimos informações apoiadas em fatos e dados.
Por que, então, não publicar uma coleção de verdadeiros? A metodologia de checagem que usamos prevê que não devemos interferir no debate público quando a informação verdadeira se impuser ou quando não houver dúvidas sobre elas.
Outro ponto curioso da semana tem a ver com um certo reordenamento interno. Após quatro anos de um governo que se sustentou em redes de desinformação, nossos checadores se depararam com discursos ― como o da ministra da Saúde, Nísia Trindade ― que não continham frases falsas ou enganosas.
Não deveria chamar a atenção que uma ministra da Saúde, uma pessoa ligada à pesquisa nas ciências biológicas, não recorra a mentiras. Mas chamou.
Sendo assim, freamos nosso primeiro impulso, de publicar as frases verdadeiras só porque elas já tinham sido avaliadas, e voltamos nossas energias para amplificar as checagens dos empossados que haviam usado conteúdos falsos, exagerados ou subestimados em suas posses.
Baseados em redes desinformativas ou não, políticos erram e manipulam dados a toda hora. Não é nossa missão fazer uma análise da intenção do político, mas qualificar o debate público, trazendo à tona as informações verdadeiras.
Em sua criação, a Lupa assumiu o compromisso de fiscalizar políticos eleitos, independentemente do lugar que ocupam. Em editorial publicado em outubro de 2022, intitulado “Eleitos serão checados pela Lupa com mesma metodologia e afinco”, a Lupa já ressaltava que “é importante que os políticos a serem empossados em 2023 saibam que nossa equipe continuará agindo dessa forma, buscando reduzir a desinformação e melhorar o debate público. Todos eles serão alvo da nossa checagem de fatos”.
E assim será.
Fazemos um monitoramento rigoroso e criterioso do que os poderosos dizem e nos comprometemos a pontuar todos os dados enganosos que encontrarmos. É para isso que estamos aqui. E é para isso que seguiremos de olho no poder.
Abraços,
Leandro Becker
Editor
Marcela Duarte
Gerente de Produto
A ‘flexibilização’ da verdade
Interessante notar que a newsletter “The Morning”, do News York Times desta sexta (6), começa com uma reflexão semelhante ao texto acima: “nos acostumamos na política americana a um certo nível de ‘flexibilização’ da verdade”, em tradução livre.
A frase abre um texto sobre o filho de brasileiros George Santos. Recém-eleito congressista republicano de Long Island, uma cidade perto de Nova York, ele inventou diplomas, histórias de tragédia familiar, fé religiosa, cargos e até uma instituição de caridade. É nesse contexto que o NYT afirma que “George Santos está ampliando a tolerância para mentiras na política dos EUA”.
Ele se recusou a renunciar, e o partido Republicano tem sido moroso em forçá-lo a sair, principalmente com as disputas pela liderança da Câmara. Com isso, a ameaça mais factível até o momento para Santos pode ser legal. Promotores em Nova York abriram investigações para saber se ele violou alguma lei durante sua campanha. No Brasil, os promotores disseram que planejam retomar acusações de fraude relacionadas a roubo de cheques.
Santos se apresentou como um administrador financeiro jovem, gay e conservador com conexões e dinheiro. Os eleitores retribuíram o elegendo. Mas, depois, quase todos os pontos importantes de sua biografia foram desmontados um a um por uma longa reportagem (uma checagem, na verdade) publicada por dois repórteres do NYT.
Nos últimos meses, Santos repetia que se formou no Baruch College e que trabalhou no Citigroup e na Goldman Sachs. O NYT não encontrou nenhuma evidência de que ele tenha recebido um diploma universitário ou tenha trabalhado nessas empresas. Na época em que ele alega que estava nas gigantes financeiras, trabalhava, na verdade, no atendimento ao cliente da TV por assinatura Dish Network.
Santos disse ter fundado uma instituição de caridade para o resgate de animais. Acrescentou que ela teria salvo mais de 2.500 cães e gatos. Ninguém achou registro disso. Também afirmou ser judeu e que seus parentes haviam fugido do Holocausto. Contou que “perdeu quatro funcionários” no tiroteio da boate Pulse em 2016, em Orlando. Mas nada disso é comprovável, afirma o NYT.
Santos passou meses se gabando do fato de sua família possuir 13 propriedades, mas registros financeiros mostram que ele sofreu despejos e teve/tem dívidas de cartão de crédito.
Certa feita, Santos gastou quase US$ 700 em uma loja de roupas no Brasil, mas o fez usando um talão de cheques roubado e um nome falso, mostram registros judiciais.
Sob intensa pressão política, Santos admitiu ter forjado algumas das alegações. Falou em "embelezamento" do currículo. Como se comum (e aceitável) fosse.
…na Procuradoria Nacional da Defesa da Democracia: a Lupa acompanha de perto a criação do órgão da Advocacia-Geral da União (AGU). Entre outras atribuições, a procuradoria representará a União para “resposta e enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas”. Ao mesmo tempo em que sinaliza a intenção do governo em agir contra a divulgação de “fake news”, a falta de detalhamento sobre como se dará a atuação da entidade tem gerado dúvidas e controvérsia, principalmente nas redes sociais. Além disso, a medida tem sido alvo de críticas de políticos e apoiadores de direita. Entre os motivos, está a definição de desinformação, de "fake news". Há risco de uso político da nova estrutura e de espaço para censura.
… na AGU: Em resposta à Lupa, a Advocacia Geral da União garantiu que a recém-criada procuradoria não vai atuar contra liberdades consagradas na Constituição Federal. A AGU ressaltou que a criação da entidade não amplia as competências administrativas do órgão, que já é responsável pela defesa judicial da União, e que a nova estrutura foi criada a partir de uma “reorganização administrativa interna”. A instituição enfatizou que, “sob nenhuma hipótese”, a estrutura atuará cerceando opiniões, críticas ou liberdades públicas consagradas na Constituição Federal. “Ao contrário, sua atuação será, exatamente, para proteger essas liberdades”, argumenta. “A desinformação mina a confiança nas instituições públicas, além de prejudicar a democracia ao comprometer a capacidade dos cidadãos de tomarem decisões bem informadas, com impactos sociais, políticos, econômicos e jurídicos de cunho negativo”, acrescenta a AGU.
Dicas? Correções? Escreva para lupa@lupa.news
Obrigado pela leitura e até a próxima semana
Não sabe o que a Lupa faz com seus dados?
Conheça nossa Política de Privacidade aqui
Enviamos este email porque você assinou nossa newsletter.
Se quiser parar de recebê-la, clique aqui.