🔎 Lente #93: A desinformação virou uma arma de guerra
Boa sexta-feira, 2 de junho. Veja os destaques desta edição da newsletter sobre desinformação da Lupa:
É urgente tratar a desinformação como um problema social;
Premiado pelo YouTube, canal desinforma sobre eleições, pandemia e Amazônia;
Membros da CPMI do 8 de janeiro divulgaram boatos sobre fraudes nas urnas.
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A desinformação como arma de guerra
“Os governos precisam reafirmar o direito à informação, não como arma de guerra ou como ferramenta de desinformação, mas como um direito humano e direito de sobrevivência.” A frase é da relatora especial da ONU para a Liberdade de Opinião e Expressão, Irene Khan, que participou do painel de abertura do Stockholm Internet Forum (SIF), realizado na terça (30) e na quarta-feira (31) na capital da Suécia. Ela não deixou as empresas de fora e acrescentou que elas devem assumir responsabilidades pré, durante e pós-crise.
O tema da edição deste ano era o papel da internet e das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) durante crises, conflitos e desastres. Isso significa que muitos participantes traziam relatos de países onde ditadores cortaram a internet durante conflitos, deixando a população sem a possibilidade de receber ou trocar informações. Htaike Htaike Aung, ativista da internet livre, denominou o caso de seu país, Mianmar, como um golpe seguido de um corte na internet – e que virou um golpe na internet. Philippe Stoll, delegado de Tecnologia Sênior da Cruz Vermelha, afirmou que a tecnologia virou objeto de guerras, assim como a água.
Leandro Becker, editor-chefe da Lupa, e eu viemos participar do evento trazendo uma visão da desinformação no cenário brasileiro, especialmente por conta das eleições. Porém, o tema central do evento não era a desinformação, nossa expertise na Lupa, mas a internet em momentos de crise, conflitos e desastres. Em diversos momentos, fiquei me questionando se não estávamos um pouco deslocados no debate, já que nossos colegas traziam experiências de guerras, golpes ditatoriais e terremotos que mataram milhares de pessoas.
Ainda que suas experiências pareçam, num primeiro momento, muito mais extremas do que a realidade brasileira, conforme o debate foi se aprofundando, percebemos que a desinformação permeava todos esses cenários catastróficos ou distópicos. Aos poucos, vimos que nossas experiências são complementares e que, por incrível que pareça, a desinformação na era da internet acaba sendo o elo entre todas elas.
Efeito disso é que o Leandro, depois de sua participação em um painel no primeiro dia, virou uma das figuras mais procuradas do evento – abaixo ele escreve sobre sua experiência, mas como é um cara muito modesto, claro que ele não menciona isso. Todos queriam trocar uma ideia, tinham algo a perguntar ou queriam fazer um comentário de como sua realidade se conecta com a apresentada por ele no painel.
Para mim, o que ficou claro é que, seja em catástrofes, seja em momentos extremos (e as eleições podem ser um desses momentos), a desinformação virou uma arma de guerra, como afirmou Irene. Ainda que seja em uma tentativa de deflagrá-la.
Um abraço,
Marcela Duarte
Gerente de Produto
É urgente tratar a desinformação como um problema social
A Lupa foi uma das vozes de um painel no Stockholm Internet Forum (SIF), na Suécia, que debateu na última terça-feira (30) a importância de criar e fortalecer mecanismos de vigilância contra desinformação, principalmente em momentos de crise, como um desastre natural, uma pandemia ou uma eleição que transforma os rumos de um país.
Após compartilhar destaques e desafios de nossa cobertura nas eleições de 2022, pude perceber que havia mais do que interesse no tema: havia identificação. Infelizmente, são comuns e assustadores os efeitos nefastos da desinformação na sociedade em todos os continentes. A razão é que ela tem criado bolhas, distorcido a realidade e promovido uma guerra de confusão em que o objetivo não é achar a verdade, mas disseminar a dúvida – e com sérias consequências, incluindo repressão, discurso de ódio e mortes.
O que o debate em Estocolmo reforçou de forma incontestável é que a desinformação não é nem nunca foi um mal da digitalização, mas, sim, um problema social. Logo, o acesso à informação de qualidade, verificada e responsável precisa ser tratado como parte dos direitos humanos – assim como água, comida e eletricidade. E mudar esse panorama exige uma intervenção de forma sistêmica, com comprometimento e responsabilidade.
O jornalismo e o fact-checking são parte disso. Mas só indicar o que é verdadeiro ou falso não é suficiente. Também é preciso investir em educação midiática para empoderar as pessoas, bem como estimular uma união de esforços que envolva tanto a esfera política quanto instituições públicas, plataformas, entidades e organizações sociais. É urgente um esforço coletivo e não apenas nas horas de crise, mas todo dia. Como um hábito.
Se a desinformação é um problema social e de direitos humanos, também é primordial que deixe de ser combatida como uma questão tecnológica. É por isso que a regulação em debate no Brasil é tão importante e não pode ter como foco apenas estabelecer regras de mercado. Precisa incluir políticas públicas para estimular, em especial, a independência das pessoas – o que vai da oferta de infraestrutura ao acesso gratuito ao conhecimento.
Eu também não podia encerrar esse texto sem citar uma palavra-chave repetida em Estocolmo: transparência. É urgente ressignificar o senso comum, no Brasil, de que ela só se resume a dados ou algoritmos. Vai muito além. Precisa estar no debate parlamentar, mas principalmente na conversa de bar e no grupo da família no WhatsApp. Em um mundo onde cada um vê uma realidade diferente na tela do celular, ela é crucial para aprendermos a separar fato de opinião e tornar o diálogo possível, com coragem e integridade.
Um abraço e bom fim de semana,
Leandro Becker
Editor-chefe
…na desinformação e discurso de ódio contra transexuais: Posts transfóbicos e narrativas falsas dominaram o debate sobre pessoas trans em grupos públicos do Facebook nos últimos quatro anos. É o que aponta um levantamento inédito realizado pelo Programa de Diversidade e Inclusão da FGV Direito Rio e o Democracy Reporting International, dentro do projeto Mídia e Democracia. Uma das conclusões é que a maioria das mensagens foi compartilhada em grupos alinhados à extrema-direita, principalmente ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
…no YouTube premiando canal que desinforma: Reportagem da Lupa mostrou nesta semana que um canal que desinforma sobre eleições, pandemia e Amazônia foi premiado pelo YouTube. Uma análise dos vídeos publicados pelo perfil Vista Pátria mostra que há conteúdos que violam as políticas de desinformação da plataforma. Em um deles, o youtuber Allan Frutuozo distorceu uma fala da diretora técnica da Organização Mundial da Saúde (OMS), Maria Van Kerkhove, induzindo seus espectadores a acreditarem que pessoas assintomáticas não transmitiam a Covid-19. Ele ainda chamou o discurso da OMS a favor do isolamento social durante a pandemia de “a maior fraude do século” – na ocasião, ainda em 2020, o Brasil já registrava 38,4 mil mortos pela doença.
…nos propagadores de fakes na CPMI dos Atos Golpistas: Deputados e senadores que participarão da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) criada para investigar os atos golpistas de 8 de janeiro estão entre os responsáveis por divulgar teorias da conspiração e falsas alegações de fraude nas eleições de 2022. Reportagem da Lupa traz um histórico sobre alguns parlamentares, como Filipe Barros (PL-PR). Relator da PEC do Voto Impresso, derrotada na Câmara em 2021, o deputado é um dos incentivadores de teorias da conspiração envolvendo urnas eletrônicas e foi o principal responsável por divulgar inquérito sobre uma invasão hacker nos sistemas do TSE, ocorrida em 2018.
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