🔎 Lente #15: Governos desinformam ao tentar tirar jornalistas de redes sociais
Boa sexta-feira, 16 de julho. Nesta edição da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa, você vai ler que:
Cresce a quantidade de governos que buscam desinformar calando a imprensa ou verdades incômodas
Lupa lança o Reflexo, podcast com especialistas para refletir sobre os impactos da desinformação em várias áreas
Cirurgião Geral dos EUA faz alerta sobre os perigos das mentiras sobre a pandemia da Covid-19
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Governos investem contra redes sociais e internet para calar jornalistas e desinformar
Quando a era da comunicação digital começou a se popularizar, ainda no final do século passado, e as redes sociais emergiram na primeira década do novo século, muitos cientistas, filósofos e acadêmicos louvaram a nova realidade como um momento importante no compartilhamento do conhecimento e no fortalecimento da democracia com a multiplicação de vozes que nunca foram ouvidas. Pensadores como o espanhol Manuel Castells ("A galáxia da internet" e "Sociedade em rede"), o americano Henry Jenkins ("Cultura da Conexão" e "Cultura da Convergência") e o francês Pierre Lévy ("Cibercultura" e "A inteligência coletiva") tratavam de descrever um mundo cooperativo, plural, colaborativo e pouco autoritário.
Em plena terceira década do século 21, o otimismo da virada do século está sendo colocado em dúvida, especialmente a questão do autoritarismo — tanto que os próprios filósofos e acadêmicos trataram de teorizar em novos livros o atual momento. É bom que tenham feito isso. Na quarta-feira, 14/7, a Reuters publicou um relatório bianual de transparência produzido pelo Twitter dando conta de que houve um aumento nas demandas de governos em todo o mundo para retirar o conteúdo postado por jornalistas e meios de comunicação em seu ecossistema.
Segundo o relatório, contas verificadas de 199 jornalistas e agências de notícias na plataforma do Twitter enfrentaram 361 demandas legais de governos para remover conteúdos no segundo semestre de 2020. É um aumento de 26% em relação ao primeiro semestre do ano e é a primeira vez que o Twitter revela a pressão por retirada de conteúdos específicos da imprensa. No mesmo período, em todo o mundo, a plataforma informou que recebeu mais de 38.524 solicitações legais de retirada de conteúdos variados do ar (de qualquer pessoa ou instituição).
Ainda assim, a investida teve pouco sucesso. O Twitter afirmou que removeu apenas cinco tweets de jornalistas e portais de notícias, sem revelar quem ou a natureza de seus conteúdos. No mundo todo, 2.600 tuítes foram retirados da plataforma de julho a dezembro de 2020 por ordem judicial. A Índia fez a maioria dos pedidos de remoção, seguida pela Turquia, Paquistão e Rússia.
A tendência é preocupante? Bastante. E acontece num momento em que governos de vários países ou restringem ou impedem o acesso de seus cidadãos a redes sociais e informações sobre o próprio país. Nos cinco anos em que morei em Pequim, na China, trabalhando como correspondente do Globo, percebi com clareza que o acesso a informações censuradas, manipuladas ou enviesadas não apenas nas redes sociais mas nos canais oficiais do governo (informações e dados) molda uma percepção de país — e, principalmente, do seu governo — que é muito diferente de quem olha ou vem de fora da China. É possível, inclusive, reescrever a História e manipular os fatos no momento em que ocorrem.
Na segunda-feira, 12/7, o governo de Cuba começou a restringir o acesso ao Facebook e a aplicativos de mensagens como o Telegram em meio a protestos antigovernamentais generalizados. Mas o problema está longe de se restringir a regimes autoritários de esquerda. No mês passado, a Nigéria, que está longe de ter um governo de esquerda, baniu o Twitter do país e ordenou que as estações de rádio e televisão não usassem a plataforma para coletar informações.
Segundo a Netblocks, uma organização que monitora os direitos ao acesso digital em todo o planeta, 35 países em todo o mundo exercem algum tipo de bloqueio ao acesso à internet ou a mídias sociais por suas populações. A lista vai de Rússia à Índia, da Venezuela à Indonésia passando por vários países africanos e do Oriente Médio. São nações de várias orientações políticas (à esquerda, à direita e ao centro) e religiosas, mas todas flertam com o autoritarismo que não admite o contraditório. Para quem acreditava no poder libertador e colaborativo da internet e das redes sociais, este é um cenário desolador.
Um grande abraço,
Gilberto Scofield Jr
Diretor de Marketing e Relacionamento
Lupa vai lançar o ‘Reflexo’: novo podcast para refletir sobre as consequências da desinformação
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A Lupa lança na quarta-feira, dia 28/7, o podcast Reflexo, sobre o impacto da desinformação na sociedade brasileira. Sempre com um convidado especial, vamos trazer discussões profundas numa linguagem simples sobre como o fenômeno contamina o debate público a respeito de temas como diversidade, jornalismo, política, meio-ambiente, entre outros.
Os debates, em formato de conversa, são compostos de convidados emblemáticos dos temas propostos para a reflexão, de especialista nos temas em que a desinformação mais afeta até pessoas diretamente afetadas por boatos nas redes sociais. Numa produção caprichada da Trovão Mídia, esta temporada terá oito episódios temáticos semanais com cerca de 40 minutos de duração cada sobre os seguintes temas: Jornalismo e o reflexo da desinformação, repactuação democrática, verificação de fatos, ciência, política, meio-ambiente, diversidade e assédio online.
Semana que vem, aqui mesmo na nossa newsletter, anunciaremos com detalhes nossas estrelas especialmente convidadas e os episódios temáticos que irão ao ar em todas as principais plataformas de streaming de áudio no país.
Se a desinformação é um fenômeno que te afeta de alguma forma — e a desinformação tem imensa parcela de culpa nos mais de meio milhão de brasileiros mortos pela Covid-19 —, não perca nenhum episódio do Reflexo.
...no cirurgião geral da Presidência dos EUA: autoridade máxima em saúde dos militares nos Estados Unidos, Vivek Murthy usou ontem seu primeiro relatório formal para alertar contra os perigos da desinformação, chamando-a de "ameaça urgente à saúde pública" do país. Ele pediu a todos os americanos, especialmente as empresas de tecnologia e mídia social, para redobrar esforços no combate à desinformação sobre Covid-19. O aviso de Murthy sobre desinformação foi considerado incomum, já que, em outros anos, esse pronunciamento foi usado para recomendações restritas à saúde, como os males do uso do tabaco até prevenção de suicídio e benefícios da amamentação.
...no Windows: reportagem da revista "Wired" alerta que recente atualização do Windows pela Microsoft não conseguiu consertar totalmente uma vulnerabilidade crítica de segurança. Criminosos tem usado um bug no Windows Print Spooler, componente do sistema responsável pela comunicação com impressoras. Essa vulnerabilidade permite que invasores controlem sistemas infectados por vírus e executem códigos de sua escolha, de acordo com pesquisadores.
...no Tribunal Europeu de Direitos Humanos: a corte rejeitou uma defesa pela liberdade de expressão apresentada por Patrick Hurbain, editor do jornal belga de língua francesa "Le Soir". A decisão — que na prática estende o “direito de ser esquecido” dos mecanismos de busca para os veículos de notícias — ordena que o jornal torne anônimo um motorista responsável por acidente de carro mortal em 1994 nos arquivos eletrônicos do "Le Soir". A matéria original do acidente, que causou a morte de duas pessoas e feriu outras três, mencionava o nome completo do motorista, mas agora, depois da decisão, este foi substituído pela letra X.
Lupa e Redes Cordiais - Treinamento para agentes comunitários de saúde
Online e gratuito, o projeto consiste em uma série de videoaulas que vai esclarecer dúvidas e boatos sobre as vacinas, além de compartilhar sugestões sobre como combater a desinformação. Se você conhece algum agente de saúde, encaminhe o link para inscrição.
Dicas? Correções? Escreva para lupa@lupa.news
Obrigado pela leitura e até a próxima semana