🔎 Lente #16: Biden quer menos desinformação sobre vacinas em todas as mídias
Boa sexta-feira, 23 de julho. Nesta edição da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa, você vai ler que:
Biden investe contra mídias sociais e TVs a cabo conservadoras para atacar desinformação sobre vacinas contra a Covid-19
Lupa lança semana que vem novo podcast Reflexo para aprofundar as grandes discussões sobre desinformação que atormentam o Brasil
Documentário sobre Anthony Bourdain usa voz do chef criada por inteligência artificial e é criticado por cineastas por falta de ética
Psiu! Conhece alguém que poderia se juntar a nós, na luta contra a desinformação? Convide-o para assinar esta newsletter.
Biden sobe o tom com redes sociais, volta atrás, mas põe o tema da desinformação sobre vacinas no centro das discussões das mídias (todas elas)
“Eles estão matando pessoas”. Foi assim, com uma única e duríssima frase, que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, respondeu na sexta-feira passada (16) ao repórter que lhe pediu que mandasse uma mensagem para “plataformas como o Facebook”. Desde o início desta semana, a Casa Branca vem dando sinais claros de que entra - de cabeça - na luta contra as notícias falsas e antecipa: as mentiras sobre as vacinas contra a Covid-19 estão na mira.
A declaração repercutiu de todas as maneiras possíveis. Tanto que o próprio Biden teve que vir a público novamente na segunda-feira para esclarecer que ele não quis dizer que o Facebook, a plataforma em si, estivesse matando gente, mas as pessoas que postam desinformação sobre a vacina, sim. Mas o presidente americano trouxe outros pontos de vista. E citou um relatório do Center for Countering Digital Hate (CCDH), uma organização não governamental que pesquisa discursos de ódio, dando conta de que a grande maioria das teorias de conspiração e desinformação anti-vacinas sobre Covid-19 originou-se de apenas 12 pessoas.
A CCDH descobriu em março que essas 12 personalidades online - que eles apelidaram de "dúzia da desinformação" — têm um conjunto de 59 milhões de seguidores em várias plataformas de mídia social, com o Facebook sendo o lugar de maior impacto. A ONG analisou 812.000 postagens e tweets no Facebook e descobriu que 65% vieram de uma dúzia de desinformadores. Entre os doze estão médicos que adotaram práticas consideradas como pseudociência, um fisiculturista, um blogueiro de bem-estar, um fanático religioso e, o mais conhecido, Robert F. Kennedy Jr, sobrinho de John F. Kennedy, que também vinculou vacinas ao autismo e redes celulares de banda larga 5G à pandemia do coronavírus. E teve sua conta removida do Instagram.
Na mesma terça, soubemos que a Casa Branca está regularmente em contato com a Fox News e outras redes da TV — especialmente as mais conservadoras — sobre a cobertura da pandemia. "Temos entrado em contato com todas as redes e muitos, muitos meios de comunicação sobre a cobertura da Covid-19 para garantir que as pessoas tenham informações precisas", disse a secretária de imprensa da Casa Branca Jen Psaki.
E por que tudo isso é relevante? Porque a Casa Branca está deixando claro que toma um caminho oposto ao que as lideranças brasileiras estão mostrando atualmente. Enquanto no Brasil, acumulam-se projetos de lei que buscam impedir a remoção e/ou a moderação de conteúdo, o governo americano urge que as redes sociais e as plataformas de tecnologia sejam mais ativas.
Para o governo Biden, é importante que as redes sociais “se comprometam a fazer investimentos de longo prazo na luta contra desinformação, incluindo mudanças em seus produtos”. A Casa Branca chega a sugerir que os algoritmos sejam redesenhados de forma a não ampliarem notícias falsas. Também pede que haja mais pontos de atrito capazes de reduzir o compartilhamento de informações falsas. Nesse quesito, entrariam mais notificações e alertas.
Washington também quer mais transparência. Em seu relatório, Vivek Murthy, o cirurgião-geral da Casa Branca — maior autoridade de saúde entre os militares — pede que as redes sociais compartilhem dados de forma transparente com pesquisadores e acadêmicos para que eles possam analisar o alcance e o impacto das notícias falsas. E, numa pegada mais internacional, pediu às plataformas a darem mais atenção a outros idiomas — que não o inglês. “As plataformas devem aumentar as equipes que fazem moderação de conteúdo em diversas línguas e melhorar a inteligência artificial para além do inglês, já que a desinformação em outros idiomas continua proliferando”, registrou Murthy.
A decisão da Casa Branca de ir para a guerra contra a desinformação sanitária tem estreita relação com o avanço da variante Delta, do novo coronavírus, e com um dado alarmante apresentado na coletiva do governo: “Segundo pesquisas, dois terços das pessoas que ainda não se vacinaram (nos Estados Unidos) acreditam em mitos sobre as vacinas contra a covid-19 ou acham que alguns desses mitos podem ser verdadeiros”, lamentou o cirurgião-geral.
Mas e como esse posicionamento do governo Biden pode afetar o Brasil? Especialistas ouvidos pela Lente destacam que ele coloca o país em xeque. “No Brasil, há uma pressão muito grande para impedir a moderação de conteúdo, ou seja, a pressão é no sentido contrário ao feito pelo governo Biden”, diz Caio Machado, diretor do Instituto Vero. “Vimos recentemente o Eduardo Bolsonaro, deputado e filho do presidente, falando sobre decreto para impedir remoção de conteúdo. Então estamos numa encruzilhada”. “Depois do Trump, o Brasil está vendo uma inversão total, de dizer que a plataforma não pode fazer nada. O conteúdo tem que ficar lá até que um juiz se manifeste. Usuário não pode jamais ser removido de uma plataforma sem que um juiz determine”, ressaltou Diego Canabarro, Senior Policy Manager para América Latina da Internet Society.
Um grande abraço,
Gilberto Scofield Jr
Diretor de Marketing e Relacionamento
Reflexo: Com participação especial de Paula Cesarino, novo podcast da Lupa vai ao ar nesta quarta-feira (28)
A Lupa lança na próxima quarta-feira (28) o podcast Reflexo, que busca debater sobre os impactos da desinformação numa linguagem simples, mas com boas reflexões sobre como o fenômeno contamina o debate público a respeito de temas como diversidade, jornalismo, política, meio-ambiente, ciência, entre outros.
Eu e a diretora executiva da Lupa, Natalia Leal, vamos conversar, toda a semana, com um time de figuras simbólicas dos temas propostos para a reflexão: de cientistas e estudiosos dos temas até pessoas afetadas pelo fenômeno da desinformação ou que lutam contra ela. Com produção da Trovão Mídia, o Reflexo terá oito episódios temáticos com cerca de 40 minutos de duração. A temporada abre com o episódio 1, que tratará de Jornalismo e o reflexo da desinformação, com a jornalista Paula Cesarino, da "Folha de S. Paulo". O episódio 2 falará de Repactuação democrática e o reflexo da desinformação e o convidado especial é Marcos Nobre, professor livre-docente de filosofia da Unicamp e pesquisador do CNPq. O episódio 3 é sobre fact-checking: Verificação de fatos e o reflexo da desinformação. Os convidados são Plinio Lopes, repórter de checagem e jornalismo de dados na Piauí, e Alessandra Monnerat, editora-assistente da plataforma de checagem "Estadão Verifica".
O episódio 4 é sobre ciência e a Covid-19: Ciência e saúde e o reflexo da desinformação e a convidada especial é a microbiologista Natalia Pasternak. No episódio 5, falaremos sobre política em tempos de estratégias de manipulação de narrativas: Política e o reflexo da desinformação e o convidado é Claudio Couto, coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas (MPGPP) da EAESP-FGV. O episódio 6 será Meio-ambiente e o reflexo da desinformação. Nosso convidado será o jornalista Claudio Angelo, coordenador do Observatório do Clima. O episódio 7 vai tratar de Diversidades e o reflexo da desinformação, com a participação jornalista Flavia Oliveira, comentarista do grupo Globo. E a temporada se encerra com um alvo constante de desinformação, no episódio 8: Assédio Online e o reflexo da desinformação, com um convidado peso-pesado.
Se a desinformação é um fenômeno que te afeta de alguma forma — e a desinformação tem imensa parcela de culpa nos mais de meio milhão de brasileiros mortos pela Covid-19 —, não perca nenhum episódio do Reflexo.
...no novo documentário sobre o chef Anthony Bourdain: no documentário, que estreou semana passada, os editores Eileen Meyer e Aaron Wickenden afirmam que as falas de Bourdain foram extraídas de clipes de áudio, cenas de filmes, entrevistas em vídeo e audiolivros. No entanto, em um artigo na New Yorker, o diretor Morgan Neville diz que usou inteligência artificial (IA) para criar três citações com a voz de Bourdain. “Eu criei um modelo de IA de sua voz”, diz Neville. Ele continua dizendo: “Se você assistir ao filme, provavelmente não vai saber quais são as linhas que foram faladas pela IA”. Críticos de cinema e documentaristas recorreram ao Twitter para expressar seu desconforto com a voz gerada artificialmente, que Neville caracterizou como uma “técnica moderna de contar histórias”. Tudo foi considerado muito além do limite do ético e moral. Depois da reação, Neville respondeu à revista "Variety", dizendo: “Tony deixou algumas frases escritas, nunca ditas. Com a autorização de seu agente literário, usamos a tecnologia de IA para dar vida a essa escrita". Tirem suas próprias conclusões.
...no 'Grande irmão' nas escolas dos EUA: um think tank conservador em Nevada, nos EUA, no mês passado sugeriu que os professores usassem câmeras corporais para garantir que não ensinassem "teoria racial crítica" em salas de aula. Leia-se: contar aos jovens americanos a perspectiva da escravidão e da segregação americanas sob o ponto de vista dos negros. É bom lembrar que câmeras corporais visavam vigiar os policiais, mas passaram a ser usadas também pela polícia para manipular seus enfrentamentos com o público.
...nos hackers chineses: na segunda-feira (19/7), a Casa Branca se juntou ao governo do Reino Unido, União Europeia, OTAN e governos do Japão à Noruega em anúncios que destacaram uma série de operações de hackers na China. O Departamento de Justiça dos EUA indiciou separadamente quatro hackers chineses, dos quais três, segundo o governo americano, seriam oficiais do Ministério da Segurança do Estado da China (MSC). A declaração da Casa Branca culpa especificamente o MSC por uma campanha de hacking em massa que usou uma vulnerabilidade no software Exchange Server da Microsoft para comprometer milhares de organizações em todo o mundo.
Lupa e Redes Cordiais - Treinamento para agentes comunitários de saúde
Online e gratuito, o projeto consiste em uma série de videoaulas que vai esclarecer dúvidas e boatos sobre as vacinas, além de compartilhar sugestões sobre como combater a desinformação. Se você conhece algum agente de saúde, encaminhe o link para inscrição.
Dicas? Correções? Escreva para lupa@lupa.news
Obrigado pela leitura e até a próxima semana