🔎 Lente #26: Estudo mostra que pesquisas no Google podem ajudar a corrigir crença em desinformação
Boa sexta-feira, 01 de outubro. Nesta edição da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa, você vai ler que:
Estudo indica que usar ferramentas de busca aumenta o esclarecimento dos temas e corrige crenças em desinformação;
YouTube diz em seu blog que vai ampliar a remoção da desinformação sobre vacinas contra a Covid-19 para todas as vacinas;
Bloqueio de acesso à Internet por governos que buscam cortar o acesso dos cidadãos à informação política se torna cada vez mais comum.
Sabe aquela pessoa do grupo de WhatsApp que insiste em mandar notícia falsa pelo aplicativo? Então, mande o link para essa pessoa assinar esta newsletter!
Estudo: pesquisar conteúdos no Google pode ajudar a corrigir crença em desinformação
Estudos de anos passados sobre pesquisa online produziram conclusões contraditórias sobre seus benefícios em termos de combate à desinformação e acesso a conteúdos confiáveis. Alguns mostraram que a pesquisa online pode de fato levar à localização de informações baseadas em fatos, enquanto outros observam que isso nem sempre é o caso por causa do viés de confirmação por parte da pessoa que busca informações e do viés algorítmico embutido nos motores de busca. Uma pesquisa que usa os termos, por exemplo, "o homem nunca foi à lua", com um viés já definido negacionista, poderia retornar respostas conspiratórias que confirmem esse pensamento, enquanto uma pesquisa com palavras mais "neutras", como "jornada espacial à lua", teria a vantagem de devolver respostas mais científicas.
O Nieman Lab acaba de publicar uma reportagem sobre um estudo que traz mais otimismo a esse debate. De um modo geral, as pesquisas no Google possuem uma maior chance de corrigir uma desinformação do que de reforçá-la. O estudo analisou buscas no Google para verificar se uma determinada afirmação sobre as minorias étnicas no Japão é verdadeira ou não e concluiu que a pesquisa pode ajudar a corrigir a desinformação. O estudo foi publicado semana passada na plataforma científica PLOS ONE. Para entender algumas das consequências da busca de informações on-line, pesquisadores do Departamento de Mídia e Comunicação da City University de Hong Kong conduziram dois experimentos sobre desinformação sobre minorias étnicas no Japão.
No primeiro experimento, os pesquisadores pediram a 1.032 japoneses adultos com idades entre 20 e 59 anos para descobrir se a falsa declaração “mais de 20% dos que recebem assistência social são imigrantes coreanos” era verdadeira ou falsa usando os mecanismos de busca. A maioria dos participantes usou o Google ou o Yahoo Japão para chegar à resposta.
Um grupo de controle foi solicitado a pesquisar sobre uma declaração falsa de que “menos de 10% daqueles que compraram online em 2012 encontraram alguns problemas em suas transações”. Os grupos tiveram cada um 10 minutos para pesquisar até que estivessem confiantes de que a afirmação era objetivamente verdadeira ou falsa. Todos os participantes também foram avaliados em um “termômetro de sentimento” sobre a Coreia do Sul como país, para avaliar se eles estavam predispostos a nutrir sentimentos discriminatórios sobre os imigrantes coreanos. Uma pontuação mais baixa indicava que eles eram mais propensos a acreditar em mentiras sobre esse grupo de pessoas. Este experimento descobriu que a pesquisa online ajuda a reduzir a probabilidade de se acreditar em desinformação, mesmo entre pessoas que estão predispostas a acreditar em informações incorretas ou falsas. A pesquisa educou, de alguma forma.
O segundo estudo usou as mesmas afirmações do primeiro, mas, desta vez, o grupo de tratamento foi dividido em três subgrupos: o grupo de tratamento original e de controle, o grupo de objetivo direcional (onde as pessoas são solicitadas a chegar a uma conclusão específica, independentemente da precisão) e o grupo de meta de precisão (onde as pessoas são solicitadas a chegar à conclusão mais correta, independentemente de suas crenças).
O grupo de tratamento original e o grupo de controle receberam exatamente as mesmas instruções do primeiro estudo, enquanto o grupo de meta direcional foi solicitado a procurar informações que fossem compatíveis com as declarações. Já o grupo de meta de precisão foi solicitado a "procurar informações tão objetivamente precisas quanto possível, independentemente da sua opinião”.
Os resultados do segundo estudo mostram que “aqueles que estavam predispostos a acreditar na desinformação corrigiram suas crenças errôneas, mesmo quando foram instruídos a buscar informações que estivessem de acordo com sua opinião anterior”. No geral, os pesquisadores concluíram que a pesquisa online ajuda a reduzir a crença errônea em informações falsas, independentemente dos objetivos do pesquisador. O estudo não entra no mérito, mas pode ser que os algoritmos de pesquisa estejam sendo modificados para ampliar as respostas com evidências em detrimentos da desinformação baseada em vieses, opiniões ou manipulações.
Tomados em conjunto, os dois estudos apontam para quatro conclusões principais:
Em média, a pesquisa online pode, sim, reduzir a probabilidade de se acreditar numa peça de desinformação. Ou seja, possui uma característica educativa;
O uso constante do mecanismo de busca melhora a percepção de todos sobre o que não é verdade, especialmente entre aqueles predispostos a acreditar em mentiras. Ou seja, fica mais fácil perceber uma peça de desinformação;
O uso constante da ferramenta de busca também foi capaz de influenciar o viés e a crença de quem pesquisa. Quem fazia a busca, mas era uma pessoa motivada a achar a verdade dos fatos, passou a ver nisso ainda mais importância. Mas a notícia melhor é que quem fazia busca procurando confirmar vieses e crenças pré-existentes também foi afetado pelo exercício da busca e passou a pesquisar - e aceitar como resposta - mais a informação correta do que uma versão que confirmasse aquilo que a pessoa pensa;
O simples exercício da pesquisa online reduziu a percepção negativa em relação aos grupos-alvo da desinformação, ou seja, aos coreanos.
Um grande abraço,
Gilberto Scofield Jr.
Diretor de Marketing e Relacionamento
YouTube decide banir qualquer conteúdo falso sobre vacinas no seu ecossistema
Na quarta-feira (29), em seu blog, o YouTube anunciou mais um passo no combate à disseminação de informações incorretas e falsas, prometendo banir qualquer conteúdo enganoso ou impreciso sobre vacinas. Todas as vacinas — e não apenas aquelas relativas à Covid-19. A empresa explicou suas diretrizes de comunidade atuais. Elas já proíbem o compartilhamento de informações médicas erradas, mas foram estendidas para cobrir vacinas "atualmente administradas" comprovadas como seguras pela Organização Mundial da Saúde e outras autoridades de saúde.
"Temos visto constantemente afirmações falsas sobre as vacinas contra o coronavírus contaminarem com desinformação as vacinas de um modo geral. Agora, estamos em um ponto em que é mais importante do que nunca expandir o trabalho que iniciamos com a Covid-19 para outras vacinas", disse a empresa no blog.
A notícia foi festejada por muitos, mas encarada com certo ceticismo pelos checadores de fatos. E por uma razão simples: esse ano, o site anunciou que baniria conteúdo falso sobre vacinas contra a Covid-19, mas os avanços foram bastante limitados. Embora a plataforma diga ter removido mais de 130.000 vídeos por violar sua "Política de informações médicas incorretas relacionadas à Covid-19", conteúdo falso sobre vacinas contra a Covid-19 e sobre a própria pandemia continuam a circular no ecossistema da plataforma em perfis e canais com milhões de seguidores. Os checadores de fatos pontuam — incluindo um grupo de email extremamente ativo que engloba as plataformas filiadas à International Fact-Checking Network (IFCN) e que vem discutindo o tema há meses — que os esforços atuais não são suficientes.
Centenas de perfis e canais em todo o mundo continuam a vender "tratamentos precoces contra a Covid" ou negar os efeitos das vacinas. E continuam no ar, apesar das denúncias. E há muitas dificuldades na checagem de um vídeo: muitas vezes os vídeos continuam no ar porque misturam fatos verdadeiros com opiniões sem embasamento ou teorias conspiratórias e negacionistas. Muitos usam este formato como estratégia. O que fazer? Derrubar todo o vídeo, que é parcialmente falso mas anti-científico em boas partes? Ou censurar apenas os trechos onde a informação falsa é flagrante?
Outro exemplo: os usuários ainda têm permissão para compartilhar conteúdo relacionado às suas experiências pessoais com a vacina, mas apenas se esses vídeos aderirem às diretrizes da comunidade do site e o canal em questão não encorajar rotineiramente a "hesitação da vacina". Já perdi as contas de gente mostrando que tomou vacina e agora uma moeda qualquer fica colada no local da vacina no braço, atraída por uma espécie de força eletromagnética. Nem todos são derrubados. Nada foi dito sobre a parceria com checadores de fatos para que atuem no ecossistema do YouTube. Aguardemos.
Obs: Na quarta-feira (29), a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) lançou o "Movimento Vacinação" — uma campanha que tem como objetivo conscientizar a população sobre a importância das vacinas em todas as fases da vida e incentivar a ampliação da cobertura vacinal no país. A Lupa faz parte desse esforço fornecendo à SBI conteúdos de desinformação sobre vacinas de um modo geral. E por quê? Porque teme-se que a resistência à vacina da Covid-19 prejudique ainda mais a vacinação de um modo geral no Brasil. De acordo com dados do Ministério da Saúde, desde 2015, metade das vacinas disponíveis no calendário infantil não atinge as metas de cobertura previstas. Doses contra poliomielite, tríplice viral ou tetra viral, por exemplo, são algumas das que estão em queda.
...na censura de governo autoritários nas redes sociais: governos em todo o mundo estão achando mais fácil do que nunca fazer com que a Internet e as empresas que nela operam se curvem às suas demandas. A Rússia forçou a Apple e o Google a remover um aplicativo que apoiadores do líder dissidente Alexei Navalny haviam criado para coordenar os votos da oposição nas eleições russas. O governo da China, por sua vez, removeu quase todo o conteúdo online relacionado a uma de suas maiores estrelas de cinema como parte de uma campanha mais ampla contra o poder das celebridades, informou o Wall Street Journal. O bloqueio total do acesso à Internet por governos que buscam cortar o acesso dos cidadãos à informação por motivos políticos se tornou cada vez mais comum, revelou um estudo da Axios.
...no Latam Journalism Review: ontem (30), a newsletter do Knight Center traz um artigo com pesquisa da ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF) e do Instituto Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS-Rio) na qual se evidencia que as redes sociais se tornaram um território hostil para a imprensa no Brasil. Num período de três meses, entre 14 de março e 13 de junho de 2021, os pesquisadores identificaram 498.693 ataques a jornalistas e à imprensa de uma forma geral no Brasil. Um quinto do total dos ataques veio de contas com alta probabilidade de comportamento automatizado, ou seja, de serem robôs.
...no Reflexo, o podcast da Lupa: a primeira temporada do Reflexo, o podcast da Lupa, chegou ao fim na semana passada, mas você não precisa ficar triste se perdeu algum ou não teve tempo de ouvir. Todos os oito episódios continuarão à disposição em sua plataforma de streaming de áudio preferida. A primeira temporada traz um compilado de discussões sobre as amplas consequências da desinformação no contexto específico e peculiar do Brasil, com pessoas que vivem a realidade do tema aqui. Imperdível para quem se interessa ou estuda desinformação. O Reflexo continua disponível gratuitamente nas principais plataformas de streaming de áudio do país, como Apple Podcasts, Breaker, Castbox, Deezer, Google Podcasts, Pocket Casts, RadioPublic e Spotify.
Dicas? Correções? Escreva para lupa@lupa.news
Obrigado pela leitura e até a próxima semana