🔎 Lente #36: Por que a Time errou na enquete vencida por Bolsonaro
Boa sexta-feira, 10 de dezembro. Veja os destaques da Lente, a newsletter sobre desinformação da Lupa:
Ao permitir manipulação de enquete, revista Time ajuda a desinformar e criar narrativa fantasiosa sobre Bolsonaro
Pesquisa mostra que Google é mais eficiente do que seus rivais ao barrar desinformação em resultados de buscas
Jornais dos Estados Unidos processam gigantes da tecnologia por monopolizar receitas publicitárias
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Revista Time desinforma ao permitir manipulação de enquete por bolsonaristas
Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro (PL) venceu uma enquete da revista Time para a “personalidade do ano”. A pesquisa online pouco tem a ver com a tradicional premiação anual da revista e, ainda que o presidente brasileiro tenha pedido que a publicação “respeite a votação”, o escolhido dos “leitores” não venceu o prêmio em nenhuma das últimas 10 edições.
A “vitória” de Bolsonaro na enquete da Time se deu por uma grande mobilização de seus simpatizantes e eleitores via redes sociais e aplicativos de mensagem, como bem explicou o jornal O Globo. Com isso, defensores do presidente promoveram uma campanha para votação em massa. O resultado passou a ser usado para a produção de conteúdos desinformativos, como falsas capas da revista e interpretações fantasiosas sobre uma suposta popularidade internacional do presidente.
A mídia mainstream -- os veículos de comunicação mais tradicionais -- gosta de usar enquetes porque é uma forma de gerar engajamento com o público e dar visibilidade aos seus conteúdos, além de dar a impressão de que a empresa é aberta a escutar a opinião popular. Mas, no mundo digital, existe sempre o risco de que grupos organizados distorçam a enquete, com o objetivo de criar falsas percepções sobre a opinião pública.
Não é de hoje que pesquisas como a da Time são manipuladas por internautas. Em 2013, por exemplo, usuários de redes sociais se organizaram para influenciar no resultado de uma por telefone do programa Brasil Urgente, na qual responderam que eram favoráveis a “protestos com baderna”. Em 2019, o goleiro Sidão, do Vasco, foi eleito “craque do jogo” em enquete promovida pela Globo após sofrer três gols, um deles após uma falha grotesca, em partida contra o Santos. Na própria Time, a prática é comum: Hugo Chavez, em 2006, e Kim Jong Un, em 2012, foram eleitos pelos “leitores” da revista após mobilização similar.
Com essa prática, veículos de comunicação sérios acabam emprestando sua imagem e credibilidade para narrativas falsas, que distorcem não apenas a percepção do público, mas também podem influenciar em processos de decisão que impactam toda uma sociedade. Manter isso vale o custo de alimentar desinformadores? Na Lupa, acreditamos que não.
Mas há soluções de meio de caminho: em 2019, por exemplo, após o goleiro vascaíno e o repórter que entregou o prêmio serem expostos de forma humilhante em rede nacional, a Globo decidiu manter a enquete. Contudo, o prêmio passou a ser decidido pelos narradores e comentaristas da partida, com a escolha popular contando somente como um voto extra. Mas no caso da Time, isso pouco importa -- até porque o voto popular já não tem peso na escolha oficial da revista, que será anunciada na próxima semana.
Mesmo que de forma indireta, a imprensa tradicional pode ajudar a espalhar desinformação, seja ao fazer escolhas editoriais questionáveis, como reproduzir falas absurdas, ou ao cometer erros involuntários. Eles são parte do processo jornalístico, mas acabam por permitir que uma informação errada se espalhe por aí.
Ainda que sem intenção de promover Bolsonaro, a Time fez exatamente isso. Criou uma enquete que acabou manipulada pelos apoiadores do presidente brasileiro. Não é surpreendente que a narrativa de que o mundo endossa e admira a postura de Bolsonaro esteja em grupos de WhatsApp e timelines de redes sociais. Não é preciso ir longe para saber que não é isso que mostram os fatos.
Um abraço,
Chico Marés
Coordenador de jornalismo
Google é mais eficiente ao barrar desinformação do que rivais
Um grupo de pesquisadores da Universidade de Zurique, na Suíça, divulgou os resultados de um estudo, ainda não publicado, sobre como diferentes mecanismos de busca contribuem -- ou não -- para espalhar teorias da conspiração. Os cientistas procuraram, de forma automatizada, termos ligados a diferentes teorias conspiratórias, e avaliaram se os cinco buscadores mais usados no mundo retornam desinformação ou não. Pelo lado bom, o buscador mais popular do mundo, o Google, não indicou desinformação em nenhum dos casos. Nas outras ferramentas, porém, sites de notícias falsas apareceram entre os primeiros resultados.
Durante o estudo, os pesquisadores buscaram termos como “qanon” e “flat earth” (terra plana) ou neutros, mas que podem estar associados a essas teorias (“9/11”, “george soros”). Depois, classificaram os 10 conteúdos mais bem posicionados na pesquisa em “desmentem a [teoria da] conspiração”, “promovem a conspiração”, “apenas mencionam a conspiração” ou “não mencionam a conspiração”. As pesquisas foram feitas de forma automatizada e simultaneamente nos diferentes buscadores, em diferentes localidades. Foram tomadas medidas para evitar que o viés do usuário influenciasse os resultados.
O Google, usado por cerca de 86% da população mundial, foi o único dos cinco produtos que não favoreceu conteúdo desinformativo. Cerca de 25% dos destaques da ferramenta desmentiam as teorias da conspiração, e o resto apenas mencionava a existência delas ou não mencionava em absoluto. Em outros três buscadores -- DuckDuckGo, Bing e Yahoo --, a proporção de conteúdos desmentindo e promovendo desinformação foi similar. Por fim, no Yandex, buscador popular na Rússia, a maior parte dos conteúdos mostrados promovia as teorias da conspiração pesquisadas.
Ao barrar desinformação dos resultados principais, os buscadores podem ajudar a evitar sua disseminação -- e vice-versa. “Considerando a alta confiança que as pessoas têm nos resultados das buscas, informações conspiratórias encontradas por usuários ao explorar um determinado tópico podem resultar na formação de crenças conspiratórias. Isso é especialmente verdadeiro quando os usuários têm pouco conhecimento de um determinado assunto”, diz o texto.
...no Instagram: nesta terça-feira, o diretor do Instagram, Adam Mosseri, anunciou que a plataforma terá novos recursos para que os pais possam monitorar a atividade de seus filhos. Com essas mudanças, os pais poderão estabelecer limites de tempo de uso e ser alertados caso seus filhos denunciem alguém. Para o público em geral, o Instagram deve lançar o “Take a Break”, uma notificação para que os usuários saibam que estão há tempo demais navegando na timeline. Nos últimos meses, a Meta (ex-Facebook), empresa que controla o Instagram, está sendo duramente criticada por ignorar pesquisas sobre os danos causados pelo uso contínuo da plataforma à saúde mental de adolescentes.
...na Justiça dos Estados Unidos: um grupo de 200 jornais de pequeno porte de diversas partes dos Estados Unidos está processando o Facebook e o Google, acusando-os de monopolizar a receita publicitária no meio digital. Com base em legislação antitruste, os jornais argumentam que as gigantes da tecnologia controlam as receitas no setor de forma “ilegítima”, e buscam recuperar as perdas supostamente causadas pelas duas empresas. Caso vença, além de ganhar um bom dinheiro, o grupo pode causar mudanças gigantescas no mercado publicitário e editorial mundial.
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