🔎Rosto confiável, produto duvidoso
#183: Imagem do doutor Drauzio está em diferentes anúncios falsos que enganam muita gente
Oi, Luciana, editora-chefe da Lupa, chegando com a Lente da semana. A edição de hoje é sobre o rosto que talvez seja o mais usado por anunciantes de suplementos alimentares de qualidade duvidosa nessa internet. Ele, o médico mais querido do Brasil, Drauzio Varella. A repórter Evelyn Fagundes, que já verificou todo tipo de suplemento falsamente ligado ao médico, explica como os anunciantes agem e como os usuários das redes sociais recebem esses conteúdos. Boa leitura!
Drauzio Varella não receitou isso – mas te fizeram acreditar que sim
É possível que você já tenha se deparado, nas redes sociais, com algum vídeo em que o médico Drauzio Varella recomenda determinado medicamento. Na verdade, é bem difícil que você nunca tenha passado por um. No entanto, muito provavelmente, esse conteúdo foi criado com deepfake, uma tecnologia de inteligência artificial (IA) capaz de manipular a narração da gravação e criar um novo discurso.
A fim de usufruir da imagem renomada do médico (talvez o mais popular do Brasil) e passar uma sensação de confiança, vendedores de produtos voltados para a saúde têm investido na criação de deepfakes de Drauzio Varella. Do ano passado pra cá, a Lupa já desmentiu seis propagandas falsas veiculadas no Facebook que usurparam a imagem do médico.
As propagandas prometem tratamentos milagrosos para problemas de visão, disfunção sexual, dores nas articulações e até diabetes, por exemplo. E se você acha que é óbvio que o médico não estaria em anúncios do tipo e que essa é mais uma daquelas fakes bobas demais para serem desmentidas, você está em outra internet.
Nos comentários dos posts, usuários se atraem pela imagem do médico vinculado às promessas, e ainda destacam que já viram tantos anúncios com o rosto de Drauzio que já nem sabem mais qual produto escolher – mal sabem eles que o médico nunca fez nenhuma daquelas propagandas.
É comum nessas publicações que o vídeo tenha uma falsa narração imitando a voz do médico, que sugere que o usuário entre em contato pelo WhatsApp com um outro profissional de saúde – este, por sua vez, é apresentado como “médico de confiança” de Drauzio ou até neto, ou sobrinho do doutor. Toda narrativa é construída para que a voz manipulada de Varella leve a vítima a cair na fraude.
Outra semelhança entre os vídeos é a promessa de que aquele “medicamento” é a solução para problemas sérios de saúde. E aqui a palavra “medicamento” vai entre aspas mesmo, afinal, geralmente, o produto nem é um medicamento, mas um suplemento alimentar.
Para ser considerado um medicamento, um produto precisa ter sido desenvolvido com rigor técnico, possuir estudos de eficácia e segurança, além de ser registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para ser comercializado. Em muitas das falsas propagandas, é dito que o “medicamento” é, sim, aprovado pela Anvisa. Essa é outra mentira.
Dessa forma, para além do uso falsificado da imagem do doutor Drauzio, ainda existe o discurso falso ao citar uma suposta validação da Anvisa. Nestes casos, a imagem irretocável do médico no país ajuda a não levantar qualquer suspeita sobre as mentiras.
🟡 Dica da Lupa
Quer verificar se um medicamento possui aprovação pela Anvisa? Basta consultar o sistema do bulário eletrônico. Por lá, você pode procurar o produto pelo nome comercializado ou pela empresa fabricante.
Acesse: consultas.anvisa.gov.br/#/bulario/
No site do Reclame Aqui, que recebe reclamações de consumidores sobre produtos, serviços e empresas, existem vários relatos de pessoas que compraram produtos voltados para a saúde após se depararem com vídeos do falso Drauzio. Parte das reclamações mostram usuários que ainda acreditam que os vídeos são reais e questionam a demora na entrega e cobranças indevidas, mas outra parcela já acusa as empresas de terem utilizado indevidamente a imagem do médico.
Dizem os reclamantes:
👤“Vi um anúncio com Dr. Drauzio Varella de um produto chamado tônico africano para problemas de disfunção erétil e comprei pagando com Pix o valor de R$ 192, mas não recebi o produto”
👤“Vende produtos como se fosse o Dr. Drauzio Varella e não entrega [...] Já se passaram meses”
👤“Durante o aguardo do produto fui surpreendida com a informação de que Varella está processando a empresa por uso indevido de sua imagem [...] Agora, quero o dinheiro do frete de volta, no mínimo”
Em entrevista à Lupa, em 2023, Drauzio repudiou esse tipo de conteúdo manipulado. “Eu passei uma vida inteira trabalhando, dando informações com critério [...] e então aparecem criminosos que produzem conteúdos [...] propagando notícias falsas como se fossem suas. É muito desanimador esse tipo de cenário”, disse o médico.
Nas redes sociais, ele já se pronunciou diversas vezes sobre esses posts desinformativos e em julho do ano passado, fez uma denúncia ao Ministério Público contra o uso de sua imagem em vídeos de supostos remédios milagrosos.
Fique de olho! O uso de medicamentos sem estudos e comprovação científica pode trazer riscos para a saúde. A Anvisa já alertou que, no caso de publicidades de suplementos alimentares, "não é permitida a realização de propagandas que alegam tratamento, prevenção ou cura de qualquer tipo de doença, ou problema de saúde, inclusive relacionados à visão". Por isso, a agência recomenda evitar a compra de suplementos que façam esse tipo de promessa.
Além disso, o uso de figuras conhecidas no país para a divulgação de produtos suspeitos ou golpes escancarados é prática cada vez mais comum nas redes sociais. Viu algum anúncio com uma personalidade que você conhece? Dá uma espiada nas redes dessa pessoa para ter certeza de que a imagem dela não foi usada indevidamente. E se o anúncio for com o doutor Drauzio, pode se poupar do trabalho. Certamente estão tentando te enganar.
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O episódio Fake News é mentira!, do podcast Salvo Melhor Juízo, publicado na última terça-feira (3), desenvolve reflexões interessantes sobre a mentira, o que a diferencia das fake news e suas implicações na história das instituições no Brasil. O pesquisador Luis Rosenfield (PUC-RS) relembra o Plano Cohen — documento forjado por militares brasileiros para justificar o golpe do Estado Novo, em 1937 — para aprofundar a discussão. Naquele evento, antissemitismo e anticomunismo sustentaram a fraude que embasou o golpe, mas a análise vai além, lançando um olhar abrangente para o papel da mentira na política brasileira. Uma aula de História e um convite a uma necessária reflexão sobre o assunto. [João Pedro Capobianco, repórter]
O ChatGPT está destruindo o modelo de negócios da internet? Segundo um artigo publicado em espanhol na Wired, sim. Dados da SimilarWeb apontam que Google, YouTube, Wikipédia, Reddit, Facebook, Instagram e X estão perdendo tráfego, enquanto o ChatGPT já figura entre os cinco sites mais visitados do mundo – e só em abril de 2025 ganhou 15% mais acessos, chegando a super 5 bilhões de visitas. Por outro lado, entre março e abril deste ano, as plataformas citadas registraram quedas de tráfego entre 2% e 6%. O artigo avalia ainda que a inteligência artificial da OpenAI está mudando a forma como buscamos e consumimos informações, substituindo aos poucos os mecanismos tradicionais de busca – e redes sociais – como porta de entrada para a web. [Evelin Mendes, editora-assistente]
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