🔎 Bolsonaro, rei Charles e a checagem – do meme?
#139: Por que a Lupa verifica algo que, para alguns, é obviamente falso (e vai continuar)
Oi, sou Leandro Becker, editor-chefe da Lupa, e para esta edição da Lente convidei os repórteres Evelyn Fagundes e Ítalo Rômany para escreverem sobre uma verificação que rendeu muita discussão nas nossas redes sociais e por isso virou reflexão por aqui. Ela envolve o casal Bolsonaro, o rei Charles III e uma montagem, digamos, nada profissional. Além disso, a invasão de perfis de Tigrinho no Instagram gerou um alerta da polícia. Você também tem recebido pedidos de amizade desses jogos? Pois muita gente tem e é bom ficar atento.
Rei Charles, Bolsonaro e o óbvio que não é tão óbvio
Recebemos pelo WhatsApp — onde os leitores podem encaminhar conteúdos que geram dúvidas quanto à veracidade — um vídeo acompanhado da seguinte mensagem: “Assisti no Sem Censura, no programa da TV Brasil, uma representante da Agência Lupa. Fiquei muito interessada se posso enviar vídeos para saber se são verdades ou fake news”. E junto da mensagem, estava um vídeo que mostrava o rei britânico Charles III exibindo um quadro do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sua esposa Michelle. Segundo a legenda, a imagem seria a nova obra do Palácio de Buckingham, em Londres.
Sim, na redação já sabíamos que o vídeo não era verdadeiro. Em meados de maio, nós — e muitas outras pessoas — acompanhamos a revelação da primeira arte oficial com a imagem do rei britânico. A notícia circulou pela imprensa em muitos países e, aqui no Brasil, também virou motivo de muitos memes.
A obra do artista britânico Jonathan Yeo, que retrata Charles em um fundo vermelho, não tem qualquer relação com o ex-presidente brasileiro e sua esposa.
Por meio de ferramentas de busca reversa, a Lupa identificou que a foto de Bolsonaro e Michelle usada no vídeo editado foi retirada de uma publicação que divulgava um perfume batizado como “Mito”, lançado no dia 30 de maio, pela marca do maquiador Agustin Fernandez. Além disso, há questões técnicas que evidenciam ser uma fake: uma delas é que, no vídeo falso, a imagem do casal se move na moldura do quadro, em mais um indício de que se trata de uma montagem.
A publicação da verificação desse conteúdo gerou repercussão nas redes sociais, principalmente no Instagram. Em 24 horas, o post recebeu quase 3 mil comentários. Muitos eram de usuários dando risadas sobre o absurdo criado na montagem, mas outra parcela relevante questionou a necessidade de combater esse tipo de desinformação. Afinal, por que a Lupa checa algo que é tão obviamente falso?
O questionamento é válido e importante. Mas o ponto central é que o óbvio para uns não é, necessariamente, o óbvio para outros. E isso ganha ainda mais relevância quando o pedido chega à Lupa e, após a publicação, é respaldado por parte da audiência, que, de fato, ficou em dúvida sobre a veracidade do vídeo. Isso, aliás, foi percebido por muitos seguidores da Lupa, que destacaram nos comentários do post o potencial danoso de memes que, mesmo parecendo inofensivos, geram dúvidas e, por consequência, espalham desinformação.
No Facebook, a Lupa observou publicações feitas usando o mesmo vídeo falso. No comentário de uma delas, foram vistas as seguintes frases: “NOSSO CAPITÃO, GRATIDÃO” e “O nosso capitão e herói”, de pessoas dando a entender que a homenagem foi feita e, portanto, a gravação era real.
Não foi a primeira vez que a Lupa verificou conteúdos obviamente falsos – como esse. O então ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, foi alvo de um post preconceituoso em junho de 2023 no qual era associado a uma pessoa vestida de borboleta azul na Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo do ano passado. Apesar de o post ter sido compartilhado por muitos em tom de “piada”, muitas mensagens destilavam discurso homofóbico e gordofóbico – e várias semeavam dúvidas ao afirmar que, de fato, era Dino nas imagens. Outro caso é o da foto falsa na qual o Papa Francisco e o Dalai Lama, Tenzin Gyatso, líder espiritual do budismo tibetano, apareciam se beijando na boca.
Exemplos de posts absurdos não faltam: a Lupa já desmentiu que Tiradentes fugiu para a França e não foi enforcado, que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes não saiu correndo e gritando no Congresso e que não havia 300 milhões de pessoas participando de um ato de Jair Bolsonaro (PL) na Avenida Paulista".
Essas fakes, por mais inacreditáveis que pareçam, têm ganhado cada vez mais tração nas redes sociais como "reais" para atacar, menosprezar, incitar o ódio e a polarização. E, por mais “inocentes” que pareçam, buscam disseminar também a dúvida, que nada mais é do que uma das sementes da epidemia de desinformação que se espalha pelo mundo. É por isso que, em tempos de redes sociais, até o óbvio precisa ser dito – e verificado.
Por um acaso, você tem recebido solicitações no Instagram de perfis do "jogo do tigrinho? E, assim como eu, tem se irritado com isso? Perfis falsos promovendo o jogo de azar "Fortune Tiger", também conhecido como "jogo do tigrinho", inundaram o Instagram, incomodando usuários com solicitações e marcações indesejadas. A polícia alerta sobre os riscos de golpes e a falta de regulamentação dessas plataformas no Brasil. Os usuários devem evitar clicar em links e sorteios suspeitos devido a riscos de segurança e privacidade, além de não interagir com os perfis suspeitos. A Meta, dona do Instagram, disse que trabalha para limitar o spam e recomenda denunciar esses perfis. É importante lembrar que explorar esse jogo é ilegal no Brasil, de acordo com a Lei das Contravenções Penais. [Evelin Mendes, editora-assistente]
Falando em golpe, também tem circulado nas redes vídeos manipulados com uso de inteligência artificial (IA) que utilizam a imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de políticos como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e o senador Sergio Moro (União Brasil), para divulgar um suposto resgate de valores de compras realizadas com CPF. Apesar de alguns estados terem programas que permitem o resgate de créditos, como o ‘CPF na nota’, esses vídeos são falsos. Para ampliar o alcance da fraude, vários posts estão sendo patrocinados no Instagram e no Facebook. Nunca é demais lembrar que, em caso de dúvida, sempre busque informações nos sites oficiais de cada estado. [Luciana Corrêa, editora]
Fotos de crianças brasileiras foram usadas indevidamente para alimentar ferramentas de IA, apontou relatório da ONG Human Rights Watch. As imagens — publicadas em redes sociais e blogs de parentes dos jovens — vêm sendo coletadas pela empresa alemã Laion. O relatório mapeou 170 fotos de crianças de Alagoas, Bahia, Ceará, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Mas o número pode ser maior, pois a ONG revisou menos de 0,0001% das 5,85 bilhões de imagens. Também preocupa o fato de links associados às fotos permitirem identificar local e data da fotografia e até o nome de algumas crianças. [Victor Terra, analista de educação]
A condenação criminal do ex-presidente dos EUA Donald Trump dividiu esquerda e direita em grupos públicos monitorados pela Palver no WhatsApp e no Telegram. Enquanto a direita brasileira amplificou a ideia de que a sentença era injusta, a esquerda celebrou a notícia como prelúdio de uma possível prisão de Jair Bolsonaro (PL) — apesar de os casos não terem, juridicamente, qualquer relação. Cerca de 1,3 milhão de brasileiros podem ter sido impactados por conteúdos sobre a condenação de Trump por ter falsificado registros comerciais como parte de um esquema de suborno que envolvia uma atriz pornô. A análise da Palver foi feita em 71 mil grupos públicos de WhatsApp e em 3,2 mil canais de Telegram entre 27 de maio e 3 de junho — antes e depois da decisão judicial. [Cristina Tardáguila, repórter]
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